Antônio Sampaio Júnior, valoroso tarefeiro do
Centro Espírita “Regeneração”, do Rio de Janeiro, era humilde servidor num
escritório.
Zeloso, correto, madrugador.
Certa feita, mal havia espanado os móveis pela
manhã, para sentar-se à máquina de escrever, foi procurado por amigo situado no
comércio do Rio.
- Sampaio – disse o visitante, sem rebuços -, sei
que você é espírita e esfalfa-se, há muito tempo, enfrentando dificuldades.
Quanto você ganha mensalmente?
- Quatro mil cruzeiros.
O homem fez um gesto irônico e observou:
- Não vale a pena.
E prosseguiu:
- Não ignoro que você tem deveres de caridade na
instituição que frequenta, socorrendo órfãos e amparando viúvas... Como é que
você arranja numerário para esse fim?
- Gasto o que posso, e, quando a despesa ultrapassa
os recursos, tenho amigos... Faço listas, apelos...
- Não vale a pena. Estou informado de que você
visita os infortunados nos morros, às vezes com sacrifício da própria saúde...
Aproveita decerto o carro de alguém...
- Não disponho dessa facilidade. Temos bonde à
porta e, depois do bonde, faz sempre bem uma caminhada a pé...
- Não vale a pena. Disseram-me – continuou o homem
– que você, às vezes, passa noites à cabeceira de enfermos... Naturalmente, o
diretor faz concessões... Boa cama no dia seguinte, ponto facultativo...
- Não é bem assim – falou Sampaio, humilde -, nem
sempre posso visitar os doentes, mas se o faço, meu dia de serviços corre
normal...
O amigo meteu a mão no bolso interno, trouxe à luz
um documento e abriu-se, por fim:
- Pois é, Sampaio, admirando você como sempre,
resolvi auxiliá-lo de vez. É tempo de você melhorar. Preciso de um sócio para
um negócio da China... Três milhões de cruzeiros. Você assina
comigo a papelada e acompanharei todo o assunto... Gastaremos talvez uns
quinhentos contos na tramitação do processo... É um navio velho que vamos
desencravar... Tudo pronto, você e eu ficaremos provavelmente com mais de um
milhão cada um. Basta só que você assine...
Sampaio, sem desejar ofender, perguntou:
- Creio na lisura da iniciativa, mas há algum
inconveniente a considerar?
- Bem, o assunto envolve alguns interesses de
repartições públicas, mas temos noventa e nove probabilidades a nosso favor...
- E se falharem as noventa e nove?...
- Ah! Se vier o contra – informou o amigo,
evidentemente desapontado -, teremos entrevista no Distrito Policial.
Sampaio, sem perder a serenidade, falou simples:
- Não vale a pena.
E recomeçou a espanar.
Livro: A Vida Escreve – Primeira Parte – Médium: Waldo Vieira
Imagem colhida na Internet, apenas para ilustração.
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